Minha relação com o futebol começou bem cedo. Uma das minhas poucas memórias bem claras de infância, é a da semi-final do Brasileirão de 1999. Eu tinha uns 04 anos e já fiquei na varanda por horas gritando, com meu irmão e minha mãe sempre me acompanhando.
Então eu fui crescendo e a paixão imensa pelo Atlético Mineiro não foi coisa de momento. Só foi aumentando. Logo, eu sempre estava onde estavam as rodinhas falando de futebol, estava euzinha, geralmente a única menina do grupinho. Bom, eu podia ficar por horas rindo e observando as conversas e discussões, mas (mesmo eu sabendo do quê estava falando, com bastante propriedade) quando eu abria a boca pra dar minha opinião, era sempre silenciada com o argumento de "Aff mulher não entende nada de futebol". Curiosamente, quase sempre um menino falava a mesma coisa e todos ~davam moral~ e eu sempre ficava naquela "PÔ CARAS, MAS EU ACABEI DE FALAR ISSO!". Mas eu não ligava, eu devia achar lindo e continuava frequentando as rodinhas masculinas e ainda reproduzia o discurso de "aff, mulher não sabe futebol" (ué, e eu era sou o quê?)
Por fim, aos 14 anos voltei a frequentar o Mineirão. Inicialmente com uma amiga, minha tia também me levava... minha família toda muito atleticana. Eu sou uma das primas mais novas e sempre achava engraçado o fato dos meus primos mais velhos, mesmo sabendo do meu amor pelo time, nunca terem me levado ao estádio, mesmo eu implorando todos os finais de semana. Mas enfim, eu por fim não ligava muito, afinal, poxa, não era lugar de mocinha. Eu devia estar fazendo coisas de mocinhas, não estar no portão 7A no meio de um monte de cara chapado, gritando, bebendo e "você sabe que eles não respeitam mulher" (UE, eles não respeitam e eu não posso ir?). E eu fui aceitando.
Quando o Mineirão fechou para a reforma pra Copa do Mundo (eu estava no último jogo, yayy!), foi um hiato pra mim. Os jogos passaram a ser em outra cidade e eu não tinha companhia, era menor de idade, não podia ir sozinha, não podia ir em caravanas. Então o Galo voltou a jogar em BH, na Arena Independência. Como tudo em BH é perto, o ~Indepa~ é pertinho da minha casa. Dá pra ir com um ônibus só, mas mesmo assim ninguém animava em ir comigo. Mas eu me conformava, afinal, os ingressos estavam num preço exorbitante, totalmente fora das minhas condições (ainda estão, mas enfim).
Então, em 2013 adentrei o maravilhoso e mágico mundo da universidade. Logo, fui abrindo minha mente pra outras situações, outras teorias e principalmente pra outros ~bairros~ do twitter e da internet. E conheci o maravilhoso feminismo. E percebi que tem sim outras meninas na mesmíssima situação que eu, que enfrentam trancos e barrancos pra estar ao lado do Galo, que calam a boca dos machistas no estádio, que não estão nem aí e vão sim, de calça, de shortinho, de camisa largona do time, de camisetinha e vão por amor, vão porque amam estar onde for, atrás do time querido. Então aos poucos fui enfrentando certas barreiras invisíveis impostas diariamente a estas mulheres frequentadoras do estádio, amantes do esporte e as vezes a gente nem vê: "mas você vai sozinha?" "mas e essa roupa?" "e quem vai com você?" "nossa mas isso é coisa de homem" (e a eterna pérola) "tá igual maria tromba homem." Aos poucos fui voltando pro lugar ao qual sempre pertenci. Um jogo aqui, um jogo ali e fui voltando pro lugar ao qual sempre percebi. E quando me dei conta, lá pro meio de 2014 já estava euzinha, com meu carrinho, indo pros jogos do Galo. Sozinha, acompanhada do namorado, dos primos, de amigas, porém sempre indo quando me desse na telha.
Muitas vezes senti medo, claro. Medo de ir até o carro sozinha após o jogo. Medo da revista policial. Medo de apanhar, medo de ser assediada por algum homem alcoolizado, medo de tudo. Os medos também foram diminuindo. A medida que a gente frequenta estádio, a gente conhece gente realmente incrível, e o ambiente não passa a ser tão hostil, a partir do momento que você tem grandes amigxs pra contar antes, durante e depois dos jogos. Ainda sofro preconceito? Sim. Ainda ouço que estádio não é lugar de mulher? Muito. A pérola ainda continua, ainda me perguntam se sou ~maria tromba homem~ na mesma frequência. Mas agora quem fala isso, fala uma vez só. Aqui não. Nem num ambiente tradicionalmente considerado masculino, nem aqui eles passarão.

Ler esse texto me traz uma imagem à mente:
ResponderExcluirTal como o zagueiro classudo, desarmando o atacante adversário que é só força na categoria, com uma humilhante simplicidade, como quem diz: "Não passarão!"
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